domingo, 8 de setembro de 2013

O resto é silêncio



Aquilo levou tanto tempo para estar ali. Se fosse procurar na certa, a data seria mais ou menos meio século atrás. Aquilo já foi um gigante, já abrigou centenas de pessoas em suas gaiolinhas, cheias de janelas que davam para um mundo todo.

As fotografias revelam uma estrutura predial gigantesca. Vários operários de cinquenta anos atrás, subindo e descendo escadas, alocando cada tijolo, cada pedaço, cada trabalho duro, enquanto as plantas eram erguidas e defendidas por engenheiros, mas ao fim, eram outros os suores, outras as labutas e lamúrias e dificuldades que ficavam ali, entre as massas, entre paredes.

Coisas que certamente nunca seriam contadas, vangloriadas ou premiadas. Os homens que deixavam suas famílias pela manhã, as senhoras que ficavam na espera, os homens que voltavam bêbados, as senhoras que se revoltavam, as coisas que terminavam daquela maneira. Mas no dia seguinte inevitavelmente mais tijolos eram sobrepostos uns sobre os outros e mais paredes se erguiam, e aquilo independia dos sentimentos de seus artistas.

Aquilo levou tanto para ali estar, para ocupar um espaço entre tantos outros prédios, tantas risadas que ecoam silenciosas pelos cômodos vazios, tantas palavras e cenas que se perdem a cada degrau de escada. Cinquenta anos de algumas histórias que nós não saberemos se aconteceu de verdade.

Agora inevitavelmente o prédio meio secular é um empecilho às facilidades da mordenidade. Há um cordão de isolamento ao redor, e ele será implodido, às cinco da tarde deste sábado. Implodido. Será reconstruído. Outro barulho, outra movimentação, outros operários, outras histórias, outros suores, outras senhoras.

Construir é sempre uma reconstrução.

O resto é o silêncio.

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