Aquilo levou tanto tempo para estar ali. Se fosse procurar na certa,
a data seria mais ou menos meio século atrás. Aquilo já foi um
gigante, já abrigou centenas de pessoas em suas gaiolinhas, cheias
de janelas que davam para um mundo todo.
As fotografias revelam uma estrutura predial gigantesca. Vários
operários de cinquenta anos atrás, subindo e descendo escadas,
alocando cada tijolo, cada pedaço, cada trabalho duro, enquanto as
plantas eram erguidas e defendidas por engenheiros, mas ao fim, eram
outros os suores, outras as labutas e lamúrias e dificuldades que
ficavam ali, entre as massas, entre paredes.
Coisas que certamente nunca seriam contadas, vangloriadas ou
premiadas. Os homens que deixavam suas famílias pela manhã, as
senhoras que ficavam na espera, os homens que voltavam bêbados, as
senhoras que se revoltavam, as coisas que terminavam daquela maneira.
Mas no dia seguinte inevitavelmente mais tijolos eram sobrepostos uns
sobre os outros e mais paredes se erguiam, e aquilo independia dos
sentimentos de seus artistas.
Aquilo levou tanto para ali estar, para ocupar um espaço entre
tantos outros prédios, tantas risadas que ecoam silenciosas pelos
cômodos vazios, tantas palavras e cenas que se perdem a cada degrau
de escada. Cinquenta anos de algumas histórias que nós não
saberemos se aconteceu de verdade.
Agora inevitavelmente o prédio meio secular é um empecilho às
facilidades da mordenidade. Há um cordão de isolamento ao redor, e
ele será implodido, às cinco da tarde deste sábado. Implodido.
Será reconstruído. Outro barulho, outra movimentação, outros
operários, outras histórias, outros suores, outras senhoras.
Construir é sempre uma reconstrução.
O resto é o silêncio.
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