Desta caminhada estou farta.
Farta de cotar meu amanhã,
E descobrir que ele sempre vai estar em baixa.
Farta de desejar a liberdade,
E estar presa em mim mesma.
Farta da demagogia que carreguei, acreditei, semeei, e
destruí.
Estou farta também do sorriso das gentes...
Que só amam por fora e por dentro são ocas...
Tão vazias quanto eu.
Mas eu disse a verdade.
Eu sou vazia.
Vazia de amor, de sentimentos e de tonalidades.
Estou sempre cinza.
E isso me deixou farta.
Também estou farta do lixo que amontoou em minha porta.
Eu quis varrer para fora, mas a prefeitura não deixou
colocar no aterro.
Risco de contaminação.
Tentei queimar, mas as pessoas de bem em prol de ambiente
disseram que eu fazia mal.
Eu fazia mal. Eu sempre fiz o mal... e ninguém quis me
parar, eu sempre fiz o mal a mim mesma.
Com essas dores do amanhã que me atormentavam hoje.
Ninguém nunca quis me parar. O lixo na minha porta
começou a incomodar os vizinhos.
E vieram me perguntar o que era.
Eu lhes disse: é poesia.
Poesia? Como Drummond, como Fernando Pessoa?!
Eu ri, ironicamente.
Não meus caros, é lixo. É o lixo extirpado da minha alma.
Quase cancerígeno. Contagioso.
Um deles se aproximou, querendo tocar.
Não toque! –Gritei.
Então uma menina, quase um anjo, pegou uma das folhas de
papel rabiscadas, e amassadas.
“Moça isso é reciclável.”
Eu lhe sorri e estendi a mão.
Pronto, querida, você está contaminada.